Estou sempre a dizer que sim. Que há demasiados livros e livros demasiados maus.
Já cheguei a sentir tonturas ao caminhar por entre os corredores de algumas livrarias, verdadeira barata tonta incapaz de encontrar o que procura, incapaz de perceber o porquê de tamanha invasão.
Vocifero muitas vezes. Não tanto contra os que escrevem e ilustram, mais contra alguns dos que editam, personagens do mundo dos livros que se recusam a cumprir o seu papel: o de saber distinguir, escolher, dizer “não” as vezes que forem precisas, e também o de descobrir valor, melhorar, ajudar a construir.
Mas desde a semana passada, quando comecei a ler “Livros de mais”, do mexicano Gabriel Zaid, tenho conseguido ver “a coisa” de vários outros prismas. Há neste livro muito mais do que este meu olhar um pouco primitivo sobre a questão do excesso de livros ou, como diz Zaid, da abundância. O livro é tão fabuloso que não tem apenas uma ou duas passagens que dão vontade de sublinhar, mas muitas páginas seguidas, todas elas muito interessantes.
Diz Zaid que “há uma tradição carpideira por parte da gente do mundo dos livros (autores e leitores, editores e livreiros, bibliotecários e professores), uma tendência para se queixarem até do bom tempo, que faz ver como desgraça o que na realidade é uma bênção: a economia do livro ― ao contrário da economia do jornal diário, do cinema, da televisão ― é viável em pequena escala”. Depois prossegue dizendo que “à medida que uma sociedade se torna mais populosa, mais rica, mais escolarizada, publica mais títulos com pouca venda: aumenta a variedade de especialidades e interesses, e torna-se mais fácil reunir alguns milhares de leitores interessados em algo muito particular (…)".
Uns capítulos mais adiante, Zaid põe o dedo na ferida, ao falar da distribuição: “Como fazer, então, sem ser adivinho, para que cada exemplar esteja no lugar e momento certos para o seu leitor? Eis o problema― cujas respostas falhadas são decepcionantes para o editor, o livreiro, o leitor, o autor. Coloque um exemplar aqui, nenhum acolá; decida se deve (ou não) voltar a encomendar, depois de o exemplar ser vendido, e se deve devolver (ou não) o exemplar que não se vendeu. Multiplique estas decisões pelos milhares de títulos e milhares de pontos de vendas e chega à situação habitual: um desastre ― aqui um exemplar não encontrou o seu leitor, acolá um leitor não encontrou o seu livro. (…) Os cientistas chamam a isto um modelo «estocástico» ― um nome elegante para o caos.”
Para quem se interessa por livros e edição (e também para quem, como eu, costuma vociferar) este é um livro imprescindível. Sem palha, bem escrito, provocador.