terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Sobre os pedidos de doação

Não há um só dia que passe em que a caixa de correio do Planeta Tangerina não receba pedidos de doação de livros. Normalmente os pedidos vêm de sítios pelos quais temos a maior das simpatias e empatias (não sei se é bem a mesma coisa, mas é importante reforçar a ideia): escolas, bibliotecas, associações culturais, centros de saúde, escolas, ATL's, ludotecas, serviços pedagógicos etc.
Não vemos as caras por detrás deste pedidos, mas apostamos que quem os faz são pessoas que arregaçam as mangas e não desistem ao primeiro não, tentando fazer chegar livros às suas prateleiras vazias. Quando recebemos estes pedidos (e são vários, todos os dias) balançamos aflitos para um lado e para o outro. Normalmente temos dito que sim, sobretudo quando partem de entidades não subsidiadas: fazemos um pacote, enviamos por correio e ficamos com a sensação de dever cumprido. Mas, aos poucos, talvez porque tenhamos enrijecido (é a vida), talvez porque os pedidos caem às centenas na nossa caixa de mensagens, começamos a aprender a dizer que não.
A certa altura começamos a interrogar-nos: até que ponto temos obrigação de fornecer gratuitamente tantas prateleiras do país, por mais bem intencionadas que sejam?
Sentimos que começa a tornar-se regra o pedido de livros às editoras e a sua oferta gratuita e, com a crise como desculpa, imagino que por vezes nem se pense noutras alternativas. Esta semana, por exemplo, chegou-nos uma mensagem de um serviço de uma grande Câmara Municipal, pedindo que doássemos livros para servirem como prémio num concurso (estavam em causa, o quê: 40, 50 euros?).
Palpita-me também que implícita ao pedido está a ideia de que é obrigação das editoras darem o seu contributo (doando os bens que vendem), sob pena de não serem consideradas parceiras nesta (boa e grande) causa nacional que é a de pôr os pequenos portugueses a ler...

Parte-se-nos o coração quando temos de dizer que não.
Mas começámos a fazê-lo, sobretudo quando achamos que há outros caminhos.

(Esperamos que as caras por detrás dos pedidos encontrem alternativas e continuem a encher as suas prateleiras de (bons) livros.)

7 comentários:

Jack. K. disse...

Acho que fazem muito bem. Penso que devem doar livros apenas em situações muito especiais e para organizações muito particulares mediante uma devida análise às condições económicas em que operam.

Quando a entidade que pretende a doação é uma Câmara Municipal, que tem, obviamente, possibilidade de os pagar, não faz qualquer sentido nenhum.

Mais, acho que eles é que têm a responsabilidade social de manter empresas inovadoras no activo e promover os seus serviços e produtos, especialmente quando se trata de uma editora independente que consegue, com esforço, resistir ao fenómeno de aglomeração de editoras que, nos últimos tempos, se tem visto em Portugal.

Continuem o óptimo trabalho!

{anita} disse...

As câmaras municipais estão muito mal habituadas no que diz respeito a lidar com a área da cultura. é como se a cultura fosse lazer para quem a produz! acho bem que digam "não" a estes casos, pois há que mostrar que o nosso trabalho É TRABALHO. É uma questão de dignidade!
Digo isto porque a minha experiência como artista plástica já me deu muitos dissabores a esse respeito. esperam que nós trabalhemos gratuitamente sem pensar que quem trabalha por iniciativa própria já tem a vida muito dificultada: sem as regalias nem as garantias de quem trabalha para o estado, trabalhando fora de horas e lutando contra muitas adversidades. Oferecer o trabalho de mão beijada porquê? Não faz sentido nenhum! os funcionários da câmara saíriam da cama de manhã se não tivessem um salário garantido?
(desculpem o desabafo, mas estas situações tiram-me do sério...)

Inha disse...

Grande texto, Isabel. Muito honesto. De facto é dificil ser crescido,não é? bjs
Inha

Su disse...

Querida Isabel, como te entendo! Gostei muito do teu texto e reflecte, como sempre, uma enorme reflexão e ponderação. Um grande beijinho e (by the way!) keep up the good work. é sempre um prazer passar por aqui e refrescar a vista e a alma com o Planeta. (su - 0a8)

M. Jesus Sousa (Juca) disse...

Olá Isabel,

Esta mensagem é dirigida especialmente a si e surge pelo intermédio da professora bibliotecária do agrupamento de escolas de Darque, em Viana do Castelo.

Sou educadora de infância e na minha sala vamos começar a trabalhar as suas histórias, pois foram-nos trazidos vários dos seus livros.

O grupo é constituído por crianças de 3 anos, de 4 e de 5, são muito activas, interessantes e perspicazes. Por isso, no seu primeiro contacto com os seus livros, repararam num pormenor a que eu não lhes soube responder...

Assim, esta mensagem é para a "preparar" para o início de um intercâmbio (a que a prof. Carminda disse ser receptiva), com a "Sala Fixe", que pode conhecer no nosso blogue, o Bloguefólio, em http://blogue-folio.blogspot.com.

Amanhã mesmo deveremos entrar em contacto, talvez por este mesmo meio - comentário no blogue.

O que me diz, podemos contar consigo?

Obrigada pela atenção,
A educadora de infância,
Maria Jesus Sousa

dora disse...

Imperativo e necessário texto, Isabel.
E presumo ainda que, fazendo-o singularmente pela P.T., dás voz objectiva a várias - todas? - editoras e "outros ofícios e oficiantes" da literatura infantil não "oficialmente" manifestados.

estelivro disse...

percebo perfeitamente a vossa situaçao... e concordo com a vossa posiçao... o trabalho deve ser respeitado...